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Do Golpe civil-militar de 1964: nada a celebrar, nada a esquecer



É de Oduvaldo Viana Filho a famosa frase: “Olhar nos olhos da tragédia é começar a dominá-la”. Esse é o paradigma que nos impulsiona a reconstruir a memória dos 60 anos do golpe civil-militar de 1964. Não há nada a celebrar, nada a idealizar. Um golpe de Estado é sempre um atentado contra a democracia, sempre se constitui como um perverso período de exceção. A história sempre nos desafia, sendo considerada a “única ciência”, na feliz expressão de Karl Marx. Trata-se do maior esforço de exercício político, a tarefa de buscar conhecer os dados de bastidores, analisar as motivações estruturais, para educar as gerações sobre a dialética da história fundada na verdade. No dia 31 de março de 1964 consolidava-se um golpe de Estado que depôs o Presidente João Goulart e que mergulhou o Brasil num dos mais sombrios períodos de sua história, mantendo generais-presidentes no poder até 1985. Foram 21 anos de arbítrio, de ilegalidades, de violência política e de violação dos direitos humanos. O golpe civil-militar que liderava esse nefasto processo de exceção proclamava palavras de ordem como “salvar o Brasil do comunismo”, “combater a corrupção”, ou ainda “restabelecer a ordem”, escamoteando num apelativo nacionalismo de ocasião a integração subserviente do Brasil aos interesses do capitalismo globalizado daquela conjuntura.

A ditadura civil-militar de 1964 a 1985 é uma página tenebrosa da história política do Brasil. Neste tempo de exceção, os direitos humanos, os direitos fundamentais foram estruturalmente violados, pela supressão da vida política real, pelas perseguições e pelas prisões de opositores ao regime, pela prática hedionda da tortura nos aparelhos de repressão, pelo manejo de interesses econômicos favorecendo grupos privilegiados, pela execução bárbara de prisioneiros políticos, pelo terror como fundamento do Estado de exceção. A miríade de reprodução dessas práticas coagia a sociedade civil, instaurava o medo e a delação, como se expressava nos sórdidos regimes fascistas do século XX. Milhares de estudantes, operários, líderes camponeses, indígenas, militantes políticos, foram presos, executados e torturados, intelectuais tiveram que sair do país para penosos exílios políticos, avançava a ideologia da segurança nacional instalando o controle absoluta do Estado, a delação e a negação dos direitos constitucionais basilares, em nome da suposta garantia da ordem. Não há nada a celebrar nesse 31 de março. Há, sim, que lançar luz sobre a tentativa de grupos atuais empenhados em efetuar a mentira histórica, fabricando engodos e produzindo narrativas falsas para encobrir um tempo de dores e de negação estrutural dos direitos humanos.

O olhar para a história nos obriga a fortalecer a crença na democracia, a promover a defesa intransigente dos direitos humanos, em todas as suas dimensões, a proclamar o sagrado amor à vida e à dignidade de toda pessoa, a proclamar igualmente a diversidade  de nossa formação cultural e  efetuar todo nosso empenho para garantir todas as conquistas efetivadas na superação da ditadura civil-militar na direção da construção política do estado democrático de direito, que nos permite decifrar esse tempo de exceção, para que nunca mais se repita.


Texto por Cesar Nunes


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